sábado, 7 de fevereiro de 2009

A CIDADE, OUTRA CIDADE E DOIS PERDIDOS NUMA NOITE SUJA


Incrível que quarenta minutos de vôo separem duas distintas cidades... Já sei o que vão dizer: “João adora falar mal de Vitória”. Muito pelo contrário, apesar de todas as incríveis trapalhadas que só acontecem aqui, em faketown, não considero ainda nenhum lugar como melhor para se viver do que aqui. Não existe lugar mais bonito, nem com menos coisas para fazer. Não existe lugar mais hospitaleiro, mesmo com a estupidez gritante no atendimento num Bar da Rosa (não o Bar da Dona Rosa... quantas rosas nessa cidade jardim, meu Deus!). Não existe povo mais gentil, apesar da não movimentação em prol das mais de doze mil famílias desabrigadas na última enchente (aliás, Macau para o nosso Imperador Ferraço é mais importante que João Neiva), mas enfim... esta é a única cidade com qualidade de vida nesse país, isso é fato. Depois de infinitos devaneios aquém (ou além) do assunto nessa nossa conversa, volto à fala de que apenas quarenta minutos de vôo separam duas cidades tão peculiares, mas também o vôo é irrelevante, pois resolvi ir ao Rio de Janeiro gastando sete horas de carro e então, como de costume, segue a resenha.
Achei um companheiro para essa empreitada, o qual prefiro não identificar, para não causar desafetos. Numa das nossas oito noites na cidade do pecado (mesmo não os tendo cometido) resolvemos, após uma sessão do hilariante filme RUMBA, jogar nossos corpos cansados na Lapa. Ah! A Lapa, só quem foi para saber. Estacionamos. Informações com um trabalhador da noite de peruca e salto. Porta de boteco. Cartaz: show de Pepê e Neném. Seis reais. Olhares estupefatos. “Por que você, não vem ficar comigo baby...”. Tietagem. Autógrafos. Fotografia. Musas voltando para casa. Karaokê aberto. Tequilas. Dois perdidos numa noite suja.
Com a incrível e incontrolável língua que o Rei do universo resolveu me dar comecei minha peregrinação pelas mesas do local. Na primeira, conheci uma educadora social. Papo agradável, mesmo tendo que explicar oitocentas vezes que eu não era de Recife, que Vitória era no sudeste e que quando falam na previsão do tempo na TV: “tempo chuvoso no sul da Bahia” ou “Ventos fortes no leste de Minas”, sim, estão falando de Vitória. Próxima mesa. Um rapaz com óculos de uns sete graus, que aumentavam bastante seus olhos, não o deixando menos bonito, com o discurso “eu tinha que me assumir assim, quem quiser gostar de mim, vai ter que ser desse jeito”. Confesso que achei que ele se referisse ao fato de se assumir gay, mas não, era pelo fato de ter cansado de usar lentes de contato e ter resolvido naquele dia sair de óculos. Cantou como um avestruz engasgado com o próprio ovo. Next table! Uma esguia e alta senhora de olhos azuis, ao seu lado seu cabeleireiro, amigo afetivo da primeira dama de Vila Velha, Xica Xiclete (sim, isso mesmo, conhecida até no Rio) e seu professor de informática, que tinha como aluno mais novo um senhor de 63 anos e aluna mais velha uma senhora de 92. Desse grupo homo-heterogêneo, a minha incrível descoberta foi que Isabelle, a linda senhora de olhos azuis, era na verdade um transexual que há anos morava em Viena e estava de férias com seu cachorrinho no Rio, sua terra natal. Ok, sem graça a informação? Então ta, ela abriu shows de Barbra Streisand e Liza Minelli. Cantando? Nãooooo.... cuspindo fogo.
Não sei como chegamos, mas chegamos a casa. O dia estava lindo. Blackout. Som baixinho. Ronco. Minutos depois, telefone tocando. Mau-humor de dorminhoco. “Alô João, tudo bom? Foi ótima essa noite. Você e seu amigo são uma simpatia. Queremos muito conhecer Vitória, já estamos programando”. Deus saberá quem foi ao telefone e, provavelmente, como foi essa noite. Agora, eu? O que consigo me lembrar é o que, depois desse tempo perdido lendo isso, vocês estão sabendo. Nesse momento, sóbrio, é esperar por quantas mais ligações irei receber.

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Obra do artista J. Victtor que nasceu em Belo Horizonte em 1957 e vive no Rio de Janeiro. Giz Pastel sobre Canson. Obra: Arcos a Lapa www.jvicttor.com.br/acervo/desenhos.htm

6 comentários:

  1. A Rosa foi assim... tudo!!! amei vc ter tocado no assunto desses jardins onde bebemos... amei a senhora de olhos azuis... amei... amei!
    bjx

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  2. Olha, eu juro que eu comecei a ler, e com vontade...mas, parei na parte da cidade com mais qualidade de vida do país, pois já estava meio puta da vida com o povo hospitaleiro e gentil, então me irritei mesmo e parei. Sou capixaba, da gema por assim dizer, então, posso falar: que qualidade de vida? que gentileza? que hospitalidade? Me poupe né João! Conto nos dedos de uma só mão quem é assim aqui. aiii, que raiva..kkkkk beijossss

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  3. Parabéns pelo texto amigo.... Capixaba gentil e hospitaleiro? kkkkk Mas li o texto inteiro e posso dizer que o mesmo está ótimo.. parabéns....

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  4. Juju querido, amei o texto, fiquei so imaginando vc na Lapa, ai q vontade de estar com vc ...
    beijos r mais beijos, meus e do Kak's.

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  5. PoXa João só vc mesmo, ri muito e ligarei para a sua casa(hahahahahha). Um abraço. E quem te contou essas mentiras sobre os capixabas? Até Cara.

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  6. Caro John, afeiçoei-me a este texto por vários motivos – está bem escrito (não que os outros não estejam), sou capixaba e por concordar em gênero, número e caso com sua afirmação, “não considero ainda nenhum lugar como melhor para se viver do que aqui”. Ademais, a história que se passou na Lapa é hilária e gostosa de ler. Congratulations!

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